sábado, 22 de março de 2008

O Tarô de Crowley

No segundo lugar em popularidade — pelo menos nos países de língua alemã e inglesa —, encontra-se um Tarô que remonta à pessoa amplamente discutida de Aleister Crowley (1875-1947)*, ao qual muitos conferem a má fama de satanista e praticante de magia negra, enquanto outros, dentre os quais pessoas muito inteligentes, vêem nele um grande iniciado. Crowley, que sofreu muito durante a sua infância sob o sectarismo estreito da casa de seus pais e não vivenciou o Cristianismo de forma alguma como uma mensagem de amor, profetizou apaixonadamente o fim dessa religião, proclamou-se anticristo e, por fim, até se tornou preconizador de uma nova era. Por ele ter, com isso, provocado o medo do satanás, adormecido no homem ocidental desde os tempos medievais, e também por não ter deixado passar em branco uma oportunidade de se tornar impopular, ele não só foi tachado de grande facínora, como também ficou com uma reputação de tal forma ruim que esta se perpetuou muito além do seu tempo. Até hoje, algumas almas temerosas estremecem só em ouvir o seu nome, e não são poucas as pessoas que temem ser a ocupação com a sua obra o ingresso garantido para o inferno. Isso não é verdade.

Crowley não era criminoso nem propagava o mal. Para ele, o Cristianismo tratava-se da subjugação de uma crença ultrapassada e hipócrita. Com esse propósito, ele atreveu-se, de fato, a manchar os valores sagrados do Ocidente, ousadia pela qual nunca foi perdoado. Como a sua tentativa de fundar uma nova religião mundial tem até hoje permanecido sem nenhum sucesso que mereça ser mencionado e, além disso, a sua obra mágica desperta o interesse apenas de um pequeno circulo de iniciados entusiastas, o nome Crowley já teria há muito tempo caído no esquecimento, se ele não tivesse, perto do fim de sua vida, concebido um novo Tarô. Este surgiu em 1944 com o nome de O Livro de Thot, assim denominado em razão do deus da sabedoria e das fórmulas mágicas do antigo Egito. Nessas cartas, pintadas pela artista Lady Frieda Harris (1877-1962), ele deixou fluir todo o seu conhecimento mágico. Por ser um homem altamente instruído e viajado, e uma sumidade extraordinariamente versada em tradições esotéricas, não é de se surpreender que esse Tarô seja além de fascinante, até hoje inigualável em seu conteúdo simbólico e em sua complexidade.

Em comparação ao Tarô de Rider, essas cartas profundamente elaboradas causam, sem dúvida, uma dificuldade. As imagens são certamente fascinantes, mas não são simples, tampouco agradáveis. Justamente por causa da profundidade e da riqueza de seu simbolismo, o acesso ao seu significado nem sempre é fácil. Além disso, soma-se o fato de Crowley, ao conceber as cartas dos Arcanos Menores, ter-se posicionado entre a representação simples, mas inexpressiva, das cartas antigas de um lado e os motivos de compreensão fácil do Tarô de Rider do outro. Pode-se dizer que ele abstraiu em suas cartas as respectivas idéias. Dessa forma, o seu significado foi bem expresso, porém somente para aqueles que são capazes de decifrar os seus símbolos. Como que para amenizar um pouco essa dificuldade adicional, cada carta do Tarô de Crowley recebeu um nome. Para algumas pessoas, isso pode ajudar na interpretação das cartas. Porém, muitos outros lêem apenas o nome das cartas sem analisar a figura, que, comprovadamente, fala mais do que mil palavras, e acabam, muitas vezes, compreendendo pouco ou nada do que a carta realmente tem a dizer.

Além disso, as cartas de Crowley diferenciam-se dos baralhos usados como modelo também em sua estrutura. Há alguns anos, pareciam conter três Magos. Essa "mudança" tão foi, contudo, idealizada por Crowley. As pinturas originais das cartas, que pertenciam ao espólio da pintora Lady Frida Harris, foram deixadas como herança para o Instituto Warburg em Londres. Quando Werner Ganser, que ficou responsável pela nova edição desse Tarô nos anos de 1980, mandou fotografá-las novamente, descobriu duas variantes do Mago. Estas lhe agradaram tanto, que ele sugeriu ao fabricante das cartas adicioná-las ao novo Tarô de Crowley como peças de colecionador. Dessa forma, houve uma aparente ampliação desse Tarô para 80 cartas, mas que, entretanto, foi reavaliada; e a partir de 1998, os dois "novos" Magos desapareceram outra vez desse baralho. Algumas cartas dos Arcanos Maiores receberam novos nomes no Tarô de Crowley. A carta A JUSTIÇA passou a se chamar AJUSTAMENTO (VIII), a RODA DA FORTUNA, também conhecida em muitos lugares como a RODA DA SORTE, passou a ser chamada reduzidamente de FORTUNA (X), a FORÇA tornou-se VOLÚPIA (XI), A TEMPERANÇA transformou-se em ARTE (XIV) e O MUNDO chama-se agora O UNIVERSO (XXI).

A mudança fundamental ocorreu com a vigésima carta. Ela chamava-se O JULGAMENTO e mostrava o milagre da ressurreição no dia do Juízo Final. No entendimento de Crowley, esse tema pertence à Era de Osíris, a era dos deuses imolados e auto-sacrificados, que já caminha para o final. A sua nova carta O AEON representa o nascimento da Era de Hórus,que agora se aproxima e na qual Hórus pode ser visto como o senhor desse novo Aeon. Dessa forma, o significado desta carta também foi, obviamente, transformado. Ela não representa mais a salvação e o milagre da transformação, como nos Tarôs antigos, mas sim o nascimento do novo e uma visão de um futuro distante.

Nenhum comentário: