sexta-feira, 3 de outubro de 2008

XV – O Diabo


Abordagem Visual

Vemos um bode com longos cornos espiralados que ri, posicionado no centro de um pênis, onde vários seres estão nos testículos, como sêmen. Algumas estruturas que parecem teias de aranha acinzentadas estão ao redor, sobre um fundo rosa. Dentre todos os tarots que estudo, esta representação do Diabo é a mais leve e lúdica.

Mitologia e Tipologia


Porque o Bode sempre é o Diabo? Talvez venha da tradição judaico cristã, ainda á época de Levítico, onde Aarão oferecia bodes para a expiação dos pecados a seu Jeová. E então lembrei da expressão bode expiatório, que vem desta época também mas que é atualizada sempre que colocamos a culpa de nossos atos em outrem. O deus dos cristãos faz isso, por exemplo, quando lhe inquirem quem chacinou centenas de milhares de mulheres e crianças em Ruanda ou os judeus na segunda guerra. A culpa sempre é do Mal, do Outro, Aquele Inominável. Um paralelo atual é quando perguntam a Bush qual a causa da crise americana e quase conseguimos vê-lo apontando o dedo ao que ele já chamou de bode barbudo muçulmano, assim obviamente se eximindo de qualquer responsabilidade governamental. Quem é o Anticristo mesmo?

Nesta carta temos o bode em sua forma animal, sendo que nos outros tarots, como em Greene, podemos ver o deus grego Pan, que era ligado aos mistérios de Dionísio. Deus também dos cultos pastorais, meio animal meio homem, sempre barbudo e com seus cascos brilhantes, tinha uma fome sexual insaciável, sendo inclusive o inventor da masturbação. Também tem relação com o deus egípcio Set, assumindo então a forma de uma serpente ou crocodilo, e ainda com Tiamat, deusa babilônica do caos, que asumia a forma de um pássaro armado de chifres e garras.

Aqui vale a pena examinarmos Lúcifer, o Anjo Caído, Anjo Maldito ou o Lado Negro da Força como arquétipo principal desta lâmina. Eu adoro a passagem bíblica do pecado original, onde Eva come a maçã oferecida pela serpente malévola sem que seu consorte dorminhoco, Adão, saiba. Após, Deus o inquire, e o homem aponta o dedo a ela, dizendo: - Mas, Senhor, ela me obrigou!!! (mulher, bode expiatório da expulsão do paraíso!).

Este Diabo que dá o fruto não é mau, ele nos dá o conhecimento, ou seja, o livre-arbítrio, a passagem do mundo uterino paradisíaco para o Mundo Real, onde temos que Ser. E convenhamos, é Deus quem primeiro aponta para o fruto proibido, ele sabe que que o homem vai arriscar, mas ele quer este ato, pois só assim o homem, sua criação, pode se tornar o iniciador de sua própria vida, a partir de sua própria escolha. É o nosso primeiro ato de desobediência libertadora... Michel Onfré comenta que ‘ Satã, o oponente, o acusador, sopra o espírito de liberdade sobre as águas sujas do mundo das origens em que triunfa unicamente a obediência – reino da servidão máxima. Devolve aos homens seu poder sobre si mesmos e sobre o mundo, livra-os de toda a tutela (divina)’. Ou como disse Sartre, estamos ‘ condenados a ser livres.’

Começamos a entender também o conceito Junguiano de sombra, pois, se somos livres, na proporção que a vida do homem se torna mais consciente e civilizada, sua natureza animal e instintual se fortalece, em resumo: quanto maior a luz, maior a sombra. Vemos em Isaías, que Jeová tinha estes opostos integrados, quando ele fala: ‘ Eu sou o Senhor e não há mais ninguém. Formo a luz e crio a escuridão, faço a Paz e crio o Mal, Eu, Senhor, faço todas estas coisas’ . Temos em nós o mal e o bem, e a lâmina quinze, não por acaso entre a Temperança e a Torre diz que, para não deixar ruir a nossa estrutura, devemos exercitar a nossa libido e instintos de forma saudável e consciente, equilibrada, temperada, pois é sabido que quando os aspectos negativos de nós mesmos não forem reconhecidos como nossos, realizados, vão agir contra nós no exterior.




Pra finalizar, gostaria de complementar com a abordagem de Valéria Fernandes sobre esta carta: ‘Desde os tempos longínquos criamos seres para adorarmos e seres para repelirmos, o que se faz necessário em virtude de termos esses dois lados dentro de nós, muito embora seja difícil admitir quando somos levados por nosso “eu antagônico” perante toda uma sociedade. A carta do Diabo expressa nossos excessos, nossas ambições desmedidas, nossa falta de moral, nossos desejos reprimidos, nossos medos e nossos segredos inescrupulosos, ou seja, todo lado obscuro pertencente ao ser humano.’ E finaliza: ‘E a não aceitação de si mesmo, a vergonha de ser o que é ou de estar fazendo algo que não se pode afirmar ser consenso social, também está implícito nessa carta.’


Cabala: Ayin – Olho. O lado mais material das coisas.

Astrologia: Capricórnio, regido por Saturno.


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XIV – A Temperança, o Equilíbrio, a Arte.


Abordagem Visual

Uma figura feminina vestida de verde, com duas cabeças (homem e mulher?), realizando o que seria uma mistura alquímica (água e fogo) em um caldeirão dourado. Sob a cabeça dela pendem duas luas crescentes, em seu peito há muitos seios e a parte superior de seu corpo está inserida em uma elipse na qual lemos "Visita interiora terrae rectificandoinvenies occultum lapidem"(Visita o interior da terra e, retificando, encontrarás a pedra oculta ). Ao lado dele um leão branco e uma águia vermelha. Que parecem estar a vontade, mesmo estando sob um piso onde sobem labaredas de fogo.


Mitologia e Tipologia


O que está muito claro nesta lâmina é a união dos opostos, de forma interna e externa. Se a dividirmos ao meio, de cada lado veremos símbolos complementares. E o gesto da figura alude claramente á destilação, purificação, ou em última análise, á Alquimia. No baralho de Marselha isso está óbvio, pois lá ela passa de um recipiente para outro um líquido ondulante que inalterado, não perde uma gota sequer. Para os gregos, este gesto – o de derramar o que há num vaso em outro – é tomado como sínônimo de metempsicose. Segundo Chevalier, é interessante notar que a origem desta lâmina está na Força e seu complemento é a Justiça, o seja, esta é a quarta virtude cardeal e, estando entre a Morte e o Diabo, ela nos avisa da grande lei da eterna circulação dos fluidos vitais e a necessidade de mantermos o equilíbrio interior entre os dois pólos de nosso ser.

A própria origem da palavra Temperança nos fala muito: temperantia, em latim significa moderado, sem excessos, clean.

Gosto muito da analogia desta carta com Diana Sagitária (Ártemis), filha de Zeus e irmã de Apolo. Ela era detentora da sabedoria instintiva, que, ao não seguir um plano lógico, relaciona-se com os ciclos da Natureza, onde nascer, crescer, reproduzir-se e morrer se alternam, expressando a renovação de todas as coisas. Como arquétipo da Virgem (pedido feito a seu pai aos 3 anos de idade), ela não tomou a maternidade como condição precípua da feminilidade, tornando-se então a figura andrógina que vemos na lâmina. A caçadora divina, como era chamada, persegue e mata os seres inconscientes de sua natureza instintiva e esquecidos da busca de si mesmos. Sempre bela, trajando saias curtas (liberdade de movimentos), levando seu arco e flechas sempre certeiros (sagitária, atingindo o alvo, que é o conhecimento)porta a tocha acesa em uma de suas mãos e a Lua Crescente em sua cabeça, representando desta forma, a Consciência do Feminino. O arquétipo de Ártemis, se levado ao exptremo negativo, no nível psicológico pode ocasionar comportamentos rígidos, preconceitos, dificultando assim a transmutação necessária ao processo de individuação.

Já Greene a vincula a Íris, que segundo Hesíodo em sua Teogonia, a apresentava como filha de Taumante e Electra. Mensageira dos deuses, e correspondente feminina de Hermes, simboliza o arco-íris, que nada mais é do que a ligação entre o céu e a terra, entre os deuses e os homens. E é interessante esta corrrespondência no baralho mitológico, pois o seu oposto complementar é a Justiça, no caso, Athená. Sentimento versus pensamento ou ainda, uma serve ao pai e outra á mãe internos de cada um, ou seja, a Temperança é o equilíbrio de cada uma destas forças, a catalisadora.


Cabala: Samekh - Suporte, fundamento.

Astrologia: Sagitário - Força que impele na direção do Supremo.


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